nascer e morrer
Quando sabemos do nascimento de alguém, principalmente nós homens, há 4 perguntas standard que fazemos : sexo... calma, sexo da criança, não a posição em que foi feito, homens mas não exageremos, bem , o tamanho da pila ainda deve haver quem pergunte.... Mas voltando às perguntas standard: sexo, peso, tamanho e nome. Tirando o nome são as mesmas perguntas que fazemos quando escolhemos uma sapateira na cervejaria:”Mostre-me lá para eu ver o tamanho. Isso tem quantos kg? É macho ou fêmea? Olhe que a fêmea pode ser do mesmo tamanho mas é mais pesada...”
Mas aí ainda se percebe porque vamos comer o animal, agora com um bebé torna-se um bocado estranho, parece um instinto canibal, ainda mais quando há pessoas que comentam “ai que coisinha, que apetitoso!”, parece que estão apreciar um leitãozinho.... Não seria suficiente perguntar se correu tudo bem e o nome, vá? Acho que é daquelas situações que não sabemos bem o que dizer então institucionalizamos umas perguntas para manter um tempo de conversa. mostrarmos algum interesse e fazemos perguntas que consideramos técnicas, de quem percebe do assunto. É conversa de elevador em vez do: ”está fresquinho”, “sim, já é tempo dele”, temos o : nasceu com 4,450kg e 58cm uma bestinha, hã? aquilo é que vai ser mamar.
Entre mulheres é diferente porque há uma cumplicidade, há aquela coisa de quem já passou pelo mesmo e uma curiosidade de quem ainda pensa passar, então têm conversa para horas: cesariana, parto normal, percentil (o termo técnico para peso/tamanho) , epidural, contrações por minuto, sapatos da médica... nós só queremos que o “elevador chegue ao destino”, enquanto para elas há também uma espécie de competição, principalmente no que diz respeito ao peso. Quanto mais pesado maior o orgulho. Deve ser a única fase da vida em que isso acontece, o resto da vida passamos a tentar emagrecer. O peso só continua a ser motivo de orgulho se a criança quiser ser apresentador do preço certo ou ser um touro da ganadaria Brites Pais.
Também acho curioso quando damos os parabéns ao pai pela criança que nasceu, no fundo estamos a dar-lhe os parabéns por um orgasmo que ele teve há cerca de 9 meses. Nem ele se lembra! E o que dizemos?: “parabéns pá! hum orgasmo, hã? seu malandro... aquele espermatozóide foi do catano, ali zum, zum , zum (enquanto fazemos gestos de zig zag), a papar todos nas curvas, sempre a travar mais tarde e depois pumba! em cheio a chafurdar no óvulo!” Porque de resto a mãe é que o carrega e a mãe é que sofre durante esse tempo, mais o parto, ela sim, merece os parabéns, trouxe alguém ao mundo.. Ok, os parabéns ao pai também podem ser por ter aturado a mulher durante toda a gravidez, concedo. “Ai a minha barriga, vai-me buscar isto, vai-me buscar aquilo. Sabes o que me apetecia agora? (isto às duas da manhã) Um frango à leitão com picles de trufas e chantili.”
Quando as pessoas morrem também temos perguntas standard: que idade? foi de quê? mas já estava mal ou foi assim de repente? Aqui, ao contrário do nascimento, as perguntas não são de circunstância, não é conversa de elevador, carregamos no botão stop do elevador, nós queremos mesmo saber e queremos saber pormenores. Queremos saber porque temos cagaço que nos aconteça o mesmo e queremos mentalmente calcular a probabilidade de nos acontecer o mesmo nas mesmas circunstâncias. Quanto mais próximo a idade, quanto mais semelhantes os hábitos, quanto mais inesperado, mais à rasca ficamos. Aqui, ao contrário do nascimento, o peso e o tamanho só interessam mesmo se trabalharmos na funerária.
Só ficamos descansados se tiver morrido um homem de 99 anos que fumava, que nunca fez exercício físico , tomava dois viagras por dia porque tinha uma namorada de 32 e outra de 38, bebia álcool todos os dias, sempre teve o colestrol acima dos 1420 e morreu no seu jacto privado que caiu no regresso de uma festa em Ibiza porque ele o vinha a conduzir bêbado com a miss playboy Maio ao colo. Assim ficamos tranquilos, quer dizer, desde que não tenhamos uma viagem de avião planeada…Fica sempre qualquer coisa a fazer comichão...
Se morrer alguém com idade e um estilo de vida aproximado do nosso desanimamos, pensamos que a vida é demasiado curta, que não nos devemos preocupar tanto com os pequenos contratempos do dia a dia, que temos que dar mais atenção ao nascer do sol, ao vento na cara, às ondas do mar… temos que aproveitar cada momento da vida quase como se fosse o último e perto daqueles de quem gostamos. A seguir pegamos no telefone pensativos…e vamos juntar frutas da mesma cor ou ver fotografias de vidas felizes de pessoas infelizes. Isto se no correio não estiver uma carta das finanças que é um antídoto perfeito para filosofias de algibeira.